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Quase eu mais adiante

Talvez seja a mesma sensação de quando eu andava de patins e esquecia de tudo, um jogar-se no ar. A velocidade e o movimento dos músculos ao sabor da música. Não havia outro, mas havia porque era o ar. Talvez uma motivação seja este acarinhar o ar. Torna-lo vibrátil. Imagem e voz. Tornar este corpo prazeroso no contato com o ar, o chão, a voz, a música. Para isso me bastar. Diante do espelho. Laboratórios solitários coreográficos. Com o estimulo da música, das sensações no corpo, da filmagem e do efeito visual. Chegar ao ponto de se apaixonar. Não é o meu corpo o outro. É o que ele produz no toque com o ar. Do gozo à aspereza do vazio eu já sei o caminho. Quando algo dali se perpetua e não é mais. O gigante dormiu e a vida depois disso dá muito trabalho. A construção segue novamente o seu fluxo, com um mundo, flores, alegrias, trocas, afetos. É depois de um bom tempo que chega novamente. As vezes dois anos, as vezes três. E vem destruindo. Resta saber que vai haver o movimento de construção, paralelo a este monstro que começa a ficar com sono e me deixar um pouco em paz. Se algo bom vai ser construído na terra úmida que fica, só com muito esforço pois são ajustes intensos. Com muito trabalho de reconhecimento do outro, com o entendimento de que há ali algo mágico que persiste, mesmo agora sem o monstro, que se escondeu, sumiu, nos deixou em paz. Uma paz de família, paz suave de afeto. Nunca mais sentir-se só. Um conforto no corpo, um ninho, um lugar. Até chegar novo monstro igualmente voraz. Vem sorrateiro e já estou na rede. Já estou lá dentro. Dentro da imagem, grudada em mim e eu grudada nela. Eu e a imagem, eu e a voz, entraram nos meus poros, pelos meus buracos, mexem nos meus órgãos, fazem vibrar os vãos, nos vazios, ecoam a voz, que acarinha transpassa e habita me incomoda, essa presença. Quando afasto me dá alívio. Afastei porque vi que era falso, me enganei, uma miragem. Os gestos que poderia fazer, os momentos que poderíamos viver não eram. Eu ouvia a voz e produzia imagens, Me invadiam e a voz me levava para o ar flutuando evaporando diluindo sumindo evanescendo infinitamente esquecendo de mim, esquecendo da vida.



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